Esta aula, introdutório, se baseou no texto disponibilizado no espaço aluno, de autoria de Caio Mário (Instituições de Direito Civil, Noção Geral de Contrato, Capítulo XXXVII), onde aborda:
184. Conceito de Contrato: romano e moderno.
185. Função social. Princípio da obrigatoriedade. Princípio do consensualismo.
186. Autonomia da vontade e intervenção do Estado.
187. Requisitos de validade: subjetivos, objetivos e formais.
188. Formação do contrato. Tempo e lugar. Contratos por correspondência.
189. Interpretação dos contratos.
Frases proferidas: ‘Quando falamos de contratos, trata-se de um negócio jurídico’, ‘O contrato exige a manifestação de vontade de duas pessoas’, ‘Vocês devem suprir as deficiências de aprendizagem de fatos jurídicos, do contrário terão problemas’, ‘A correlação entre obrigações e contratos é muito forte’, ‘A lei prestigia o negócio jurídico, por isso é mais difícil encontrar exemplos de ato jurídico sentindo estrito’, ‘Aí você reclama para o Bispo’, ‘Núncio é um mensageiro… é um mero papagaio’, ‘Paulo Nader prega que o direito não se ocupa com fatos pequenos’, ‘Contrato é um negócio jurídico bilateral’, ‘Todo contrato é, pelo menos, um negócio jurídico bilateral’, ‘Se é contrato, é pelo menos um negócio jurídico bilateral, mesmo sendo um contrato unilateral’, ‘Aqui dentro eu posso invocar a minha liberdade de cátedra’, ‘Os patrimonialistas são a ampla maioria dos doutrinadores’, ‘Eu penso que existe obrigações com conteúdo não patrimonial, logo existem contratos de cunho extra patrimoniais’, ‘Quanto menos desenvolvido for uma sociedade, mais formal é… as sociedades desenvolvidas não tem tempo para bobagens… é preciso dinamismo’.
As anotações abaixo, objeto de temas tratados nas três primeiras aulas desta cadeira, foram extraídos do blog Juris Facultas.
Teoria Geral dos Contratos
O conceito de contrato surgiu com o relacionamento das pessoas na vida em sociedade; na verdade, o próprio conceito de sociedade traz a ideia do contrato (“contrato social”).
“O contrato é um ato jurídico bilateral, (…), cujo objetivo é a criação, a alteração ou até mesmo a extinção de direitos e deveres de conteúdo patrimonial.”– Flávio Tartuce
É o contrato a fonte principal do direito das obrigações.
Segundo Orlando Gomes, a palavra contrato possui 3 significados: a mais ampla evidencia que este é todo negócio jurídico decorrente do concurso de vontades; a acepção restrita adiciona que os contratos possuem natureza obrigacional; e a restritíssima acrescenta que aos demais significados que o contrato teria natureza patrimonial.
Inicialmente, cabe esclarecer que um negócio jurídico unilateral e bilateral é diferente de contrato unilateral e bilateral. Nos negócios jurídicos a classificação em unilateral e bilateral significa o envolvimento de, respectivamente, uma e mais de uma parte. Portanto, o contrato será sempre negócio jurídico bilateral porque possui duas partes contratantes, ou seja, duas declarações de vontade. Já os Contratos unilaterais e bilaterais há a referência na quantidade de prestações; se unilateral somente há prestação para uma das partes, mas se bilateral (ou sinalagmático) há prestação e contraprestação. (Ex. doação é contrato unilateral)
Sobre a patrimonialidade do contrato, a doutrina se subdivide em duas correntes: uma que reconhece o caráter patrimonial e outra que não.
A primeira, defendida por Caio Mário, afirma que os contratos possuem natureza patrimonial, em que esse caráter é necessário, ainda que seja indireto.
A segunda é defendida por Antunes Varela. Para o doutrinador, quando se diz que um contrato tem que haver patrimonialidade, ainda que indireta, na verdade se está raciocinando a obrigação pelo seu descumprimento, não pelo seu implemento. Os direitos de personalidade são imateriais, portanto obrigações que envolvam esse direito não são patrimoniais e, nem por isso, deixam de haver contrato. A corrente acima (Caio Mário) afirma que pelo fato de se caber dano moral isso seria o caráter patrimonial indireto, mas essa corrente replica no sentido que, no cumprimento da obrigação, desse modo não haveria caráter patrimonial. Pensar no dano moral é pensar reverso do que o código prega, quer seja o implemento da obrigação.
A palavra ‘pacto’ pode ser utilizada como sinônimo de contrato, assim como ‘convenção’. Em Roma, o contrato e o pacto eram convenções entre as partes, entretanto o primeiro era aquele cuja violação era dotada de sanção, ao passo que o segundo não tinha sua violação sancionada.
Requisitos de validade dos contratos
O contrato constitui um negócio jurídico bilateral, por isso os elementos constitutivos, por consequência, acabam sendo aqueles dos negócios jurídicos.
“Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I – agente capaz;
II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III – forma prescrita ou não defesa em lei.”
Os requisitos de validade podem ser subjetivos, objetivos ou formais.
Os subjetivos dizem respeito à capacidade, legitimação e consentimento dos sujeitos. O consentimento é a convergência de vontades (Orlando Gomes); havendo dissenso expresso, se percebe a inexistência do contrato, ao passo que o dissenso oculto enseja na anulabilidade contratual.
Os objetivos, à possibilidade, liceidade, determinação e economicidade (este tem a ver com o caráter patrimonial).
E os formais a forma ad solemnitatem.
Há certos contratos que necessariamente precisam ser escritos, como a fiança, compra e venda de imóveis. Portanto, a forma pode ser:
- Ad substantiam/ad solemnitatem: possui forma imposta por lei cuja inobservância levará a sua nulidade.
- Ad probationem: é aquele em que a lei não exige formalidade do negócio; não é da essência do negócio jurídico, mas é usada para facilitar a comprovação que o negócio se sucedeu.
“Art. 227. Salvo os casos expressos, a prova exclusivamente testemunhal só se admite nos negócios jurídicos cujo valor não ultrapasse o décuplo do maior salário mínimo vigente no País ao tempo em que foram celebrados.
Parágrafo único. Qualquer que seja o valor do negócio jurídico, a prova testemunhal é admissível como subsidiária ou complementar da prova por escrito.”
Evolução histórica
O contrato surgiu com o relacionamento das pessoas na vida em sociedade.
O contrato era muito formal (sacramentalismo), dispensando, muitas vezes, a vontade das partes. Era uma categoria abstrata, apenas se visualizava um contrato se ele estivesse materializado, dividindo-o entre contratos verbis, re ou litteris. Surgiram categorias de contratos que se celebrava consenso, o acordo puro das vontades; entretanto, somente a venda, a locação, o mandato e a sociedade eram reconhecidos como consensuais, nos demais prevalecia a materialidade da declaração do que a vontade.
Nos demais casos se devia obedecer rigidamente ao ritual consagrado: a inscrição material no livro do credor (litteris), a traditio efetiva da coisa (re), a troca de expressões estritamente obrigatórias (contratos verbis). Uma vez observando o tal ritual, o contrato gerava obrigações e vinculava as partes.
Ao lado do contractum se estruturou o pactum. O primeiro possuía uma normatização, dotados de actio (sanção). Já o segundo era apenas vontade das partes, não sendo dotado de força cogente; o pacto não tinha nome especial nem forma predeterminada. Entretanto, ambos eram genericamente nomeados de conventiones.
No direito moderno, a distinção entre pacto e contrato perdeu razão de ser, tratando-as como sinônimos. Logo, toda convenção é dotada de força vinculante e mune o credor de ação para perseguir em juízo a prestação em espécie ou em equivalente.
No direito romano, dado o caráter personalíssimo da obrigação, os sujeitos se vinculavam por “seus próprios corpos”, diz Caio Mário, sendo possível a execução sobre os bens do devedor em momento posterior.
Com o crescimento econômico, o formalismo foi perdendo lugar, quase ao ponto de libertar-se do formalismo, quase em condições de declarar que o contrato se formava solo consensu.
Durante a Idade Média houve estagnação, observando-se as formalidades exigidas em Roma. Passou a ter mais valor a declaração do que as formalidades haviam sido observadas do que a verificação de sua prática efetiva.
Não houve a dispensa direta da sacramentalidade, porém a sua abolição indireta. Houve um abalo à importância dos rituais romanos, creditou-se a força no poder de uma declaração de vontade, enunciada sob a invocação da divindade. Uma quebra de compromisso, equivalente à mentira, ao pecado.
A estagnação medieval foi superada com o novo surto mercantilista.
Em seguida, a teoria contratual viria a sofrer com as crises do contrato:
- Massificação: a produção se expandiu e, na mesma proporção, os contratos. Acabou se alterando a lógica do direito dos contatos. Começou a demandar um intervencionismo do contrato. Houve a criação de normas protetivas e atividade reguladora do estado. Houve a criação do contrato de adesivo.
- Normatividade geral e única migrou para uma mais plural: criação de microssistemas, assim como o CDC, estatuto do idoso, isto é, legislações que estão ao lado do CC, mas que não o incorporam. Ordenamento plural.
- Crise de confiança e necessidade de reconstrução da eticidade e socialidade.