Esta aula abordou o tema Evicção:
Evicção
Evicção é a perda da coisa diante de uma decisão judicial ou de um ato administrativo que a atribui a um terceiro. Geralmente, decorre de uma sentença judicial, entretanto, o STJ tem entendido que pode estar presente em casos de apreensão administrativa.
São elementos subjetivos da evicção: o alienante, aquele que transferiu a coisa evicta de forma onerosa; o evicto, aquele que perdeu a coisa adquirida; e o evictor, aquele que teve a decisão judicial ou a apreensão administrativa a seu favor.
Há ainda a garantia da coisa perdida por evicção aos objetos que tenham sido adquiridos em hasta pública. Nesse caso, o arrematante evicto poderá ir a juízo em face do executado, já que foi este que se beneficiou diretamente, uma vez que teve sua obrigação extinta. O arrematante terá direito ao preço que pagou pela coisa mais as perdas e danos que tenha sofrido.
“Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção. Subsiste esta garantia ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública.”
A exclusão da responsabilidade, cláusula de non praestaenda evictione, pode ocorrer, desde que seja expressa, não se presumindo em nenhuma hipótese. Mesmo excluída a responsabilidade pela evicção, se esta ocorrer, o alienante responde pelo preço da coisa; ou seja, se o evicto não sabia do risco da evicção ou, informado do risco, não o assumiu.
“Art. 448. Podem as partes, por cláusula expressa, reforçar, diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção.
Art. 449. Não obstante a cláusula que exclui a garantia contra a evicção, se esta se der, tem direito o evicto a receber o preço que pagou pela coisa evicta, se não soube do risco da evicção, ou, dele informado, não o assumiu.”
O alienante só fica totalmente isento da responsabilidade se houver cláusula expressa e o adquirente for informado sobre o risco da evicção, isto é, sabia e aceitou o risco.
Portanto, não havendo cláusula de irresponsabilidade pela evicção, a responsabilidade do alienante será plena, podendo o evicto prejudicado pleitear:
a) Restituição;
b) Indenização dos frutos que tiver sido obrigado a pagar;
c) Indenização pelas despesas do contrato e prejuízos que resultarem da evicção (como despesas de registro, lucros cessantes, danos materiais…);
d) Custas judiciais e honorários advocatícios.
“Art. 450. Salvo estipulação em contrário, tem direito o evicto, além da restituição integral do preço ou das quantias que pagou:
I – à indenização dos frutos que tiver sido obrigado a restituir;
II – à indenização pelas despesas dos contratos e pelos prejuízos que diretamente resultarem da evicção;
III – às custas judiciais e aos honorários do advogado por ele constituído.
Parágrafo único. O preço, seja a evicção total ou parcial, será o do valor da coisa, na época em que se evenceu, e proporcional ao desfalque sofrido, no caso de evicção parcial.”
Quanto ao preço da coisa (restituição), havendo evicção total, será o valor da coisa à época que ocorrer a perda total; mas sendo parcial, será o valor proporcional ao desfalque sofrido. Por se considerar a coisa no momento efetivo da perda, buscou-se vedar o enriquecimento ilícito.
Ainda que a coisa alienada esteja deteriorada, salvo se houver dolo do adquirente, a responsabilidade do alienante permanece (pagamento dos incisos do art. 450). Isso porque há aplicação do nemo potest venire contra factum proprium.
“Art. 451. Subsiste para o alienante esta obrigação, ainda que a coisa alienada esteja deteriorada, exceto havendo dolo do adquirente.”
Mas se o evicto tiver auferido vantagens das deteriorações e não tiver sido condenado a pagar tais valores ao evictor, o valor dessas vantagens deverá ser deduzido da quantia pleiteada ao alienante. Maria Helena Diniz exemplifica com os valores advindos de venda de materiais decorrentes da demolição do prédio realizada pelo evicto.
“Art. 452. Se o adquirente tiver auferido vantagens das deteriorações, e não tiver sido condenado a indenizá-las, o valor das vantagens será deduzido da quantia que lhe houver de dar o alienante.”
Quanto às benfeitorias, caso necessárias ou úteis e não abonadas ao evicto pelo evictor, deverão ser pagas pelo alienante, uma vez que o evicto e tido como possuidor de boa-fé. Uma vez abonadas as benfeitorias ao evicto pelo alienante, este será levado em conta no momento da restituição. Isto é, caso não abonadas = restituição + benfeitorias; mas caso abonadas = restituição – benfeitorias.
“Art. 453. As benfeitorias necessárias ou úteis, não abonadas ao que sofreu a evicção, serão pagas pelo alienante.
Art. 454. Se as benfeitorias abonadas ao que sofreu a evicção tiverem sido feitas pelo alienante, o valor delas será levado em conta na restituição devida.”
No caso de evicção parcial, de perda considerável, poderá o evicto optar entre a rescisão do contrato e a restituição da parte do preço correspondente ao desfalque. Caso não considerável a evicção parcial, poderá o evicto somente pleitear indenização por perdas e danos.
“Art. 455. Se parcial, mas considerável, for a evicção, poderá o evicto optar entre a rescisão do contrato e a restituição da parte do preço correspondente ao desfalque sofrido. Se não for considerável, caberá somente direito a indenização.”
Quanto à configuração de perda considerável, afirma F. Tartuce que levar-se-á em conta a essencialidade da parte perdida em relação às finalidades sociais e econômicas do contrato. É a própria aplicação do princípio da função social dos contratos. Exemplifica o doutrinador no caso da evicção parcial da parte menor de uma fazenda, porém a parte perdida é justamente sua parte produtiva.
Denunciação da lide
“Art. 456. Para poder exercitar o direito que da evicção lhe resulta, o adquirente notificará do litígio o alienante imediato, ou qualquer dos anteriores, quando e como lhe determinarem as leis do processo.
Parágrafo único. Não atendendo o alienante à denunciação da lide, e sendo manifesta a procedência da evicção, pode o adquirente deixar de oferecer contestação, ou usar de recursos.”
Segundo infere-se do artigo, a denunciação da lide seria obrigatória para que o evicto possa exercer o direito que da evicção lhe resulta. No entanto, os tribunais têm entendido que essa denunciação não é obrigatória, sendo possível reaver o preço da coisa por meio de ação própria, mesmo na falta da intervenção de terceiro. Assim foi o entendimento na V Jornada de Direito Civil:
“434 – Art. 456. A ausência de denunciação da lide ao alienante, na evicção, não
impede o exercício de pretensão reparatória por meio de via autônoma.”
O enunciado 29 da I Jornada de Direito Civil permitiu a denunciação da lide per saltum, ou seja, que seja responsabilizado pela evicção qualquer um dos responsáveis pelo vício.
“29 – Art. 456: a interpretação do art. 456 do novo Código Civil permite ao evicto a denunciação direta de qualquer dos responsáveis pelo vício.”
Isso porque a denunciação per saltum, por trazer mais opções de demanda ao evicto prejudicado, tutela mais efetivamente o direito material. Ademais, os efeitos contratuais são ampliados, além da primeira relação jurídica estabelecida; trata da aplicação da função social dos contratos. Como aduz outro enunciado da CJF:
“21 – Art. 421: a função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito.”
Não atendendo o alienante à denunciação da lide e sendo manifesta a procedência da evicção, afasta-se a aplicação do art. 75, II, do CPC.
“Art. 75. Feita a denunciação pelo réu:
II – se o denunciado for revel, ou comparecer apenas para negar a qualidade que Ihe foi atribuída, cumprirá ao denunciante prosseguir na defesa até final.”
Por fim, quanto à aplicação do princípio da boa-fé objetiva, é vedado a possibilidade de o evicto demandar o alienante se tinha conhecimento do vício e do risco de perder a coisa
“Art. 457. Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia que a coisa era alheia ou litigiosa.”