#1 – Penal/Criminal – Caso Maria Cláudia Siqueira Del Isola – Brasília – 2004

Dia 09 de dezembro de 2004, manhã de uma quinta-feira que deveria ser normal como outra qualquer… Maria Cláudia, 19 anos, filha do diretor educacional do Colégio Marista de Brasília, telefonou para sua mãe por volta das 8h avisando que iria para a faculdade – a Universidade de Brasília, onde cursava Pedagogia – e deixaria seu carro em casa, pois, pegaria carona com uma amiga… a mãe estranhou porque ela não costumava sair sem o próprio carro.

Como de costume, seus pais voltaram para casa às 12h30 e, ao término do almoço, por volta das 14h, uma amiga telefonou perguntando por que Maria Cláudia não fora à faculdade… sua mãe entrou em desespero. Maria Cláudia sempre falava de seus amigos e os locais para onde ia, o que estava acontecendo não era uma atitude normal de sua filha. Começou a ligar para os demais amigos de Maria e ninguém sabia onde ela estava. Às 17h do mesmo dia, Cristina registrou o desaparecimento da filha.

A DESCOBERTA

A primeira suspeita da polícia foi sequestro, já que nenhum objeto da casa foi levado… no domingo 12/12, pela manhã, policiais estiveram na casa de Maria para instalar escutas telefônicas e a família estava reunida na cozinha… à tarde, um agente desceu pela escada que dá acesso à piscina e área de serviço e estranho um forte cheiro que exalava de dentro de um quarto, embaixo da escada. O pai disse que usavam o quarto para depósito e que o cheiro poderia ser de algum produto químico ou de um rato morto.

Pediu, então, que a porta fosse aberta e se deparou com um monte de terra fofa e úmida, no pé da escada… ao passar a mão na terra, sentiu o cadáver… era Maria Cláudia. Seu corpo estava deitado de bruços, com os braços amarrados para trás, nua da cintura para cima, com uma saia e sem calcinha; havia sinais de violência sexual anal e vaginal, onde encontraram sêmen… a cabeça estava voltada para a escada, envolta em um saco plástico… marcas no pescoço denunciavam estrangulamento.

Enquanto isso, na cozinha, a empregada doméstica Adriana de Jesus dos Santos, 20 anos, que morava há 2 anos com a família de Maria Cláudia – juntamente com seu companheiro, Bernardino do Espírito Santo, 30 anos, e seu filho de 5 anos – fazia café para os policiais e consolava a família. Ainda participaram de orações por Maria Cláudia no sábado… ao saber da localização do corpo, Adriana começou a chorar e, interpelada pelos investigadores, confessou o crime.

Adriana, no momento, acusou seu companheiro Bernardino, que também trabalhava na casa, de ser o mentor e executor do crime. Bernardino deixou a casa ainda na manhã de domingo, por volta das 9h e, segundo investigações posteriores, às 10h estava em Ceilândia, onde tinha uma namorada que estava grávida dele… deixou R$200,00 com ela.

Na casa, deram falta de R$ 2mil, dos quais pagou cerca de R$ 1,7mil a um taxista em Taguatinga – na tarde daquele domingo – para deixá-lo em um hotel, ao lado da Rodoviária de Feira de Santana, o que aconteceu às 4h30. Segundo o gerente do hotel, Bernardino entrou sem preencher qualquer ficha, tomou banho e saiu duas horas depois, ao amanhecer.

Versão de Adriana – Maria Cláudia se despediu, pegou a mochila, a chave do carro e saiu dizendo que ia para a aula. A empregada continuou a lavar a louça, mas interrompeu o serviço, foi até a garagem e viu que o caseiro e a estudante conversavam. Retornou, então, à cozinha e o caseiro começou a chamá-la… ele tinha agarrado Maria e a arrastado até a sala.

Adriana insistiu que apenas cumpria ordens dele, mas confessou que amordaçou Maria com fita crepe e amarrou-a com fios. Maria Cláudia resistiu, mas sofreu abusos sexuais e foi esfaqueada; Bernardino enterrou o corpo e, com ajuda da Adriana, limpou o chão da sala. Bernardino chegou a rezar o terço e chorar; Adriana servia café e suco de maracujá aos presentes.

Versão de Bernardino – perceberam que Maria Cláudia sairia com uma amiga e decidiram matá-la, pensando que a família acharia que ela desaparecera durante esse encontro… então, a atraíram até a cozinha, onde Adriana a acertou na cabeça com um pedaço de pau por várias vezes. Desacordada, foi amarrada e amordaçada e, depois, Adriana mandou que ele estuprasse a estudante e asfixiasse – segurou Maria Cláudia para que Bernardino o fizesse, depois desferiram várias facadas. Esconderam o corpo dentro da casa.

A família se mudara para o Lago Sul dois anos antes do crime e, por ser uma casa maior que a anterior, precisavam de um caseiro… Bernardino, indicado pela avó da vítima, trouxe referências e foram aceitas. Posteriormente, precisavam de uma empregada e, como Bernardino ganhou a confiança dos patrões, permitiram que ele trouxesse Adriana, com quem mantinha um relacionamento desde 2001 (se conheceram em Salvador/BA)… ela já tinha um filho de aproximadamente 2 anos. Cada um deles tinha um quarto, um ao lado do outro.

Bernardino foi preso no dia 20 de dezembro, tomando cerveja em uma barraca da Praia da Boca do Rio, em Salvador. Antes, dera um nome falso – Antonio de Jesus Santos – mas, os policiais encontraram na carteira dele uma foto da namorada, Adriana de Jesus Santos, ex-empregada da família e cúmplice confessa do assassinato. Confessou ainda ter furtado 1.800 dólares dos pais da vítima, bem como outros crimes como:

→ a autoria de um estupro e tentativa de homicídio praticado em Brasília, no ano de 2003, pelo qual ainda não houve condenação;

→ a prática de pequenos furtos na infância e, quando tinha poucos mais de 20 anos, um roubo a um edifício comercial, com uso de arma branca;

→ furto dentro de um ônibus.

A prática criminosa fazia parte de seu cotidiano… portava um alvará de soltura em seu bolso.

Ambos, na época, disseram que planejaram o crime, pois, Adriana sentia ciúmes e raiva da estudante… Bernardino sentia vontade de manter relações sexuais com Maria, então, aproveitou para roubar a família e satisfazer sua vontade.

DADOS PROCESSUAIS

Segundo o relato dos acontecimentos constantes nos autos, a partir do qual foi identificada a conduta de cada um dos criminosos – o que poderão ver na sentença abaixo:

“Segundo uma testemunha – o vizinho, que estava varrendo a calçada de sua casa – Maria Cláudia já estava dentro de seu veículo com a porta fechada e o vidro aberto quando foi abordada pelo caseiro Bernardino e, por isso, retornou para a casa.

Sua mãe saiu cedo de casa e seu pai estava com sua irmã, que se encontrava hospitalizada por um problema de saúde. Dominada por seus algozes, Maria Cláudia efetuou 2 ligações – uma para o celular da mãe e outra para o Colégio Marista – mas ninguém atendeu… posteriormente, sua mãe ligou para ela, que disse estar a caminho da universidade na companhia de uma amiga e, por isso, deixaria o carro em casa.

Posteriormente, uma amiga liga para o celular de Maria Cláudia às 8h30, retornando uma ligação que a vítima lhe havia feito, mas o celular estava desligado; ligou, então, para a casa da vítima e uma pessoa atendeu dizendo que Maria tinha saído e não sabia para onde ela tinha ido. Era com este álibi que os algozes pretendiam fazer crer que a vítima tinha saído de casa de carona – o que justificaria a permanência do carro na residência – e desaparecido”.

A sentença apresenta detalhes da perícia no corpo de Maria Cláudia, além da fixação da pena de cada um dos crimes cometidos pelos algozes pautado na mecânica dos fatos… a descrição da sentença é muito detalhada e vale a pena ser lida.

Em 22 de junho de 2005, Bernardino e Adriana foram pronunciados:

→ Bernardino como incurso nas penas do artigo 121, §2º, incisos III, IV e V; artigo 155, caput; artigo 213 c/c 226, inciso I; artigo 214 c/c artigo 26, inciso I; artigo 211, na forma do artigo 69, todos do Código Penal;

→ Adriana como incursa nas penas do artigo 121, §2º, incisos I, III e IV; artigo 155, caput; artigo 213 c/c 226, inciso I; artigo 214 c/c artigo 26, inciso I; artigo 211, na forma do artigo 69, todos do Código Penal.

Houve desmembramento do julgamento, sendo Adriana julgada em 12 de novembro de 2007, e Bernardino no dia 12 de dezembro de 2007.

No entanto, a condenação de ADRIANA foi pautada nas penas do artigo 121, §2º, incisos I, III e IV, cumulado com os artigos 213 e 214, combinados com o artigo 226, I e ainda com o art. 211 e 69, todos do Código Penal:

→ pelo homicídio: 30 anos de reclusão, em regime inicialmente fechado;

→ pelo estupro: 12 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicialmente fechado;

→ pelo atentado violento ao pudor: 12 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicialmente fechado;

→ pela ocultação de cadáver: 3 anos de reclusão.

Totalizou, portanto, em 58 (cinquenta e oito) anos de reclusão, em regime inicialmente fechado – link: Sentença de Adriana.

A defesa de Adriana apresentou Protesto por Novo Júri quanto ao crime de homicídio e Apelação quanto aos crimes de estupro e atentado violento ao pudor (exceções permitidas ao Princípio da Unicidade). Foi marcado o dia 10 de dezembro para o julgamento de Bernardino e o novo júri de Adriana.

Em 12 de dezembro de 2007, Bernardino foi condenado à 65 anos de reclusão, incurso nas penas do artigo 121, §2º, incisos III, IV e V; artigo 155, §4º, inciso II; artigo 213 c/c 226, inciso I; artigo 214 c/c artigo 26, inciso I; artigo 211, na forma do artigo 69, todos do Código Penal: (Link: Sentença de Bernadino).

→ pelo homicídio: 30 anos de reclusão, em regime inicialmente fechado;

→ pelo estupro: 12 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicialmente fechado;

→ pelo atentado violento ao pudor: 12 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicialmente fechado;

→ pelo furto qualificado: 7 anos de reclusão em regime fechado;

→ pela ocultação de cadáver: 3 anos de reclusão.

Adriana teve sua pena quanto ao crime de homicídio mantida em 30 anos de reclusão.

Bernardino também apelou da sentença, que foi parcialmente provida e, graças à Lei n. 12.015/2009, conseguiram a exclusão da condenação pelo crime de atentado violento ao pudor, o que reduziu sua pena para 44 anos de reclusão, em regime inicialmente fechado e, quanto à Adriana, sua apelação resultou na redução para 38 anos e 3 meses de reclusão, em regime fechado.

Veja ementa:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRIBUNAL DO JÚRI. CRIME DE HOMÍCIDIO TRIPLAMENTE CIRCUNSTANCIADO. ESTUPRO, ATENTADO VIOLENTO PUDOR, OCULTAÇÃO DE CADÁVER E FURTO QUALIFICADO. PRELIMINARES. NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. OITIVA DE CORRÉU COMO TESTEMUNHA, EXCESSO DE ACUSAÇÃO, REALIZAÇÃO DE JULGAMENTO CONJUNTO E DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA A PROVA DOS AUTOS. REJEITADAS. MÉRITO. CRIMES DE ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. LEI 12.015/09. TIPO ÚNICO. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS. RETROATIVIDADE DOSIMETRIA DAS PENAS. REDIMENSIONADAS.

1. Distribuição de peças dos autos aos jurados pelo Representante do Ministério Público em sessão do plenário do Júri. Nulidade não configurada, eis que esta previsão constava expressamente do art. 466, § 2º, do Código de Processo Penal vigente à época do julgamento.

2. Circunstâncias agravantes não articuladas no libelo à época (artigo 484 parágrafo único, inciso II-CPP) podem ser incluídas nos quesitos – “se resultar dos debates o conhecimento de existência de alguma circunstância agravante, não articulada no libelo, o juiz, a requerimento do acusador, formulará o quesito a ela relativo”; e, não ficaram vedadas no novo Código de Processo Penal – art.413 § 1º;476 e 492 -CPP.

3. O pedido de julgamento individual de ré submetida ao segundo julgamento em decorrência de “protesto por novo júri”; e não em conjunto com o corréu que está sendo submetido ao primeiro júri, não tem amparo legal, ante a ausência de qualquer prejuízo para a apelante.

4. Evidencia-se decisão manifestamente contrária à prova dos autos a ensejar novo julgamento, somente quando a decisão proferida pelo Conselho de Sentença for absolutamente desprovida de suporte fático, o que não ficou caracterizado nos presentes autos.

5. Com o advento da Lei 12.015/09, os crimes de estupro e de atentado violento ao pudor, antes com núcleos independentes, passaram suas condutas a constituírem tipo penal único, impondo-se a retroatividade para beneficiar os apelantes, em homenagem a novatio legis in mellius, que é de aplicação imediata.

6. Rejeitada a preliminar para declarar nulos os julgamentos com referência à ré/apelante Adriana de Jesus Santos por cerceamento de defesa. Maioria. rejeitadas as demais preliminares arguidas. Dado parcial provimento aos recursos. E de ofício, excluir condenação dos apelantes a pena, fixada pelo Juiz do Conhecimento, do crime previsto no art. 214, caput, do Código Penal.

(Acórdão n.445836, 20050110000473APR, Relator: JOÃO TIMÓTEO DE OLIVEIRA, Revisor: GEORGE LOPES LEITE, 1ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 12/08/2010, Publicado no DJE: 28/09/2010. Pág.: 169).

Em 2009, a família de Maria Cláudia recebeu indenização pela divulgação das fotos do processo, quando do encontro do corpo de Maria Cláudia, no valor de 10mil reais… as fotos foram divulgadas por dois jurados… ainda é possível ver as fotos buscando no Google o site “Lovely Disgrace Maria Cláudia Del Isola”… são chocantes, tristes e denotam a crueldade e perversidade da dupla criminosa.

Ambos permanecem presos.

Fontes: Correio Braziliense, Diário do Grande ABC, G1 Globo.com – Folha de São Paulo,     Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios e Teratologia Criminal.

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