Em função de outro compromisso não pude comparecer nesta aula…
Pesquisando pela internet encontrei um texto que trata de ações possessórias, de autoria de Omar Aref Abdul Latif, que resume bem todo o conteúdo afeto a este assunto.
AÇÕES POSSESSÓRIAS
Há duas teorias fundamentais voltadas à conceituação da posse
– Teoria subjetiva (clássica): foi desenvolvida por Savigny, para esta teoria a posse decorre da conjugação de dois elementos básicos, primeiro é o “corpus”, e depois o “animus”. “Corpus” é o poder físico sobre a coisa, trata-se do elemento material da posse, já o “animus” representa o elemento subjetivo, o elemento ético, representando a vontade do possuidor de ter a coisa como sua, para esta teoria a vontade de possuir para si originaria a posse jurídica, então uma distinção entre posse e detenção, na detenção o possuidor não se comporta em relação a coisa com ânimo de dono, assim para a teoria subjetiva aquele que detém a coisa em nome alheio não é possuidor, como por exemplo, o locatário, o comodatário, o depositário, entre outros.
– Teoria objetiva: difundida por Ihering, segundo essa doutrina, o elemento objetivo, ou seja, o poder de fato sobre a coisa é o que caracteriza a posse. A posse é então a exteriorização de um direito sobre o bem, que importa na sua utilização econômica, ainda que exercida em nome de outrem.
O nosso Novo Código Civil, artigo 1.196, adotou a teoria objetiva. De acordo com a teoria objetiva pode haver a bipartição da posse, a co-existência da posse direta e da posse indireta sobre o mesmo bem, em situações como a do usufruto, do comodato e da locação, entre outros. E, desse modo o possuidor indireto também pode reclamar em juízo a proteção possessória.
Natureza jurídica da posse
Para aqueles que defendem a teoria subjetiva, a posse é ao mesmo tempo um fato e um direito, aponta-se que se trata de um acontecimento casual que produz efeitos jurídicos, já para teoria objetiva a posse é simplesmente um direito por representar um interesse juridicamente protegido. A doutrina moderna tende a considerar a posse como um direito.
O Professor Caio Mario da Silva Pereira realça que o debate doutrinário desse aspecto não tem hoje grande importância bastando dizer que nascendo a posse de uma relação de fato converte-se desde logo em uma relação jurídica.
Admitida a posse como direito perdura o dissenso sobre a natureza desse direito, ou seja, se ele é pessoal ou real. Civilistas como Caio Mario da Silva Pereira, Orlando Gomes, e Pontes de Miranda conclui que a posse é um direito real. Eles dão conta; realçam que a sujeição da coisa à pessoa é direta e imediata, e o direito do possuidor é exercitado “erga omnes” como todo direito real.
O Código de Processo Civil, no artigo 10, §2º não reconhece que o direito de posse tem natureza real, dispõe que nas ações possessórias, a participação do cônjuge do litigante só será indispensável no caso de composse ou de atos praticados por ambos os cônjuges. A participação do casal em uma ação possessória não decorre da natureza jurídica da posse, mas da comunhão de direitos e obrigações.
Classificação da Posse
No aspecto objetivo, a posse é justa ou injusta. Somente a posse justa é objeto da proteção judicial. Essa classificação tem em conta o modo de aquisição da posse.
Posse justa é aquela adquirida em conformidade com o direito. E, posse injusta é adquirida de forma violenta, clandestina ou precária, como prevê os artigos 1.200 e 1.208 do Novo Código Civil.
No aspecto subjetivo, a posse é de boa ou má-fé. Essa classificação interessa principalmente aos efeitos que produz em relação aos frutos e rendimentos auferidos pelo possuidor durante o tempo em que reteve a coisa, interessa também para definir eventual direito à indenização por benfeitorias e acessões introduzidas.
Se o possuidor ignora o vício ou o obstáculo que o impede de adquirir a coisa possuída, sua posse é de boa-fé. Se ele conhece o vício ou o obstáculo, age de má-fé, como disposto no artigo 1.201 do Novo Código Civil. O possuidor de má-fé tem plena consciência de que não lhe assiste o direito de reter a coisa, ou seja, está ciente da ilegitimidade da sua condição. E, por fim a posse pode ainda ser direta ou indireta, como prevê o artigo 1.197 do Novo Código Civil. Essa classificação é importante para identificar a ilegitimidade ativa nas ações possessórias. Tem a posse direta da coisa, aquele que não é o dono dela, mas exerce uma das faculdades inerentes ao domínio. Tem a posse indireta, o proprietário que se desvincula de um dos atributos ligados ao domínio cedendo-o a outrem o seu exercício.
Proteção Possessória
Um dos efeitos da posse é justamente o direito aos interditos, como previsto nos artigos 1.210 e 1.211 do Novo Código Civil. O Código de Processo Civil disciplina como ações possessórias típicas, à ação de reintegração de posse, a de manutenção da posse, e o interdito proibitório. Os embargos de terceiros, e a nunciação de obra nova não são consideradas ações tipicamente possessórias. O que determina o caráter possessório da ação não é o pedido, mas a causa de pedir. Somente será possessória, a ação que tem por fundamento a posse. Se o autor disputa a posse com fundamento no domínio, a ação será petitória, e não, possessória, como por exemplo, ação reivindicatória que é uma ação petitória, e ação de imissão da posse.
Diante do esbulho que é uma agressão que faz cessar a posse do autor cabe ação de reintegração de posse (a doutrina chama de ação de força espoliativa).
Havendo turbação, agressão que apenas embaraça o exercício da posse, cabe ação de manutenção da posse (na doutrina é ação de força turbativa).
O interdito proibitório é cabível para corrigir agressões que ameaçam a posse. Essa ação tem caráter preventivo, pois busca impedir a concretização da turbação ou do esbulho.
Os interditos são diferenciados no Código de Processo Civil levando-se em conta as providências a serem adotadas em juízo diante da agressão à posse.
Fungibilidade das Ações Possessórias
Diante do disposto no artigo 920 do Código de Processo Civil, admite-se a conversibilidade dos interditos, o juiz pode outorgar proteção possessória que seja adequada ao caso concreto, cujos requisitos estejam presentes embora o autor tenha formulado um pedido diverso.
A ideia é permitir a concessão da tutela pertinente e idônea diante da possibilidade de alteração do estado de fato no curso da lide.
Cumulação de Pedidos
Ao pedido possessório podem ser cumulados outros pedidos como prevê o artigo 921 do Código de Processo Civil.
Competência
Tendo por objeto coisa móvel, a ação possessória de vê ser ajuizada no foro do domicílio do réu. Versando sobre imóvel, observa-se a competência do foro da situação da coisa litigiosa como dispõe o artigo 95 do Código de Processo Civil.
Trata-se de competência absoluta, pelo critério objetivo material.
Admite-se ação possessória no Juizado Especial Cível como prevê os artigos 3º, IV e 4º da Lei 9.099/95.
Natureza Dúplice das Ações Possessórias
O Código de Processo Civil, no artigo 922 admite que o réu formule em seu favor pedido contraposto ao do autor. O réu pode pleitear em seu favor a proteção possessória, além de indenização pelos prejuízos frequentes para eventual agressão à posse praticada pelo autor. Autor e réu ocupam simultaneamente posições subjetivas na relação processual, pois o réu pode obter como consequência direta da rejeição do pedido do autor, a tutela da sua posse independente de reconvenção.
Deve haver pedido expresso na contestação para que se aplique a regra do artigo 922 do Código de Processo Civil.
Exceção de Domínio
No juízo possessório discute-se apenas o direito a posse como tutela de mero fato. Não se admite debate a respeito do domínio da coisa (propriedade), salvo se ambos os litigantes disputam a posse alegando propriedade, ou ainda, quando duvidosas ambas as posses como dispõe a súmula 487 do Supremo Tribunal Federal.
Já no juízo petitório a pretensão reduzida tem por fundamento o direito de propriedade.
Consagra-se então, a autonomia da posse perante a propriedade, não podendo ser negada a reintegração ou a manutenção ao verdadeiro possuidor, pelo simples fato de alguém alegar e provar o domínio sobre a coisa legitimamente possuída por aquele como prevê o artigo 1.210, § 2º do Novo Código Civil.
Não se pode então utilizar a exceção de domínio como matéria de defesa, em uma ação possessória como reza o artigo 923 do Código de Processo Civil. A consequência imediata do dispositivo será que o possuidor, não proprietário, que uma vez ajuizada a ação possessória, poderá pedir a recuperação da coisa pelo legítimo dono.
Este não poderá recorrer ao juízo petitório enquanto a possessória não tiver sido julgada em definitivo. O objetivo da vedação legal seria impedir que a ação voltada ao reconhecimento do domínio possa retardar ao julgamento do pedido possessório. A doutrina e a jurisprudência tem reagido contra essa norma. Acórdãos do Supremo Tribunal Federal vêm aceitando que apenas na pendência de processo possessório fundado na alegação de domínio é defeso as partes mover ação de reconhecimento de domínio. Pode ser ação de usucapião ou reivindicatória.
Procedimento das Ações Possessórias
O procedimento da ação possessória é determinada por circunstâncias de natureza temporal. Se a ação é de força nova, ou seja, é proposta dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho, observa-se o rito especial dos artigos 926 a 931 do Código de Processo Civil. Se a ação de for de força velha, ou seja, proposta a mais de ano e dia, após a violação da posse observa-se o procedimento comum (ordinário ou sumário dependendo do valor da causa).
Tratando-se de interdito proibitório, o procedimento será sempre especial de acordo com os artigos 932 e 933 do Código de Processo Civil.
Não se pode falar em força nova ou força velha em relação ao interdito, pois a ameaça de violação à posse deve ser necessariamente atual. Nas ações de força velha não incide o disposto nos artigos 928 e 929 do Código de processo Civil que autoriza a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração da posse, mas o autor pode obter a tutela antecipada nas ações de força velha com fundamento no artigo 273 do Código de Processo Civil.
A concessão da tutela liminar pode ficar condicionada a prestação de caução real ou fidejussória. A caução pode ser exigida se o réu provar que o autor carece de idoneidade financeira para responder por perdas e danos caso venha decair do pedido.
Nos processos possessórios não há instauração de execução autônoma para efetivação da sentença, ou seja, não há instância executiva somente. A posse é mantida ou restituída ao vencedor da ação mediante simples expedição de mandado ocorrendo então na mesma relação processual atividade jurisdicional de cognição e execução.
Fala-se que ação possessória é executiva “lato sensu”. Dessa forma, não se admite oposição de embargos em face da efetivação da sentença.
Se o demandado (o réu) tem benfeitorias a indenizar e pretende exercer o direito de retenção deve suscitar o tema na contestação. O direito de retenção deve ser reconhecido na sentença da ação possessória, o réu poderá se valer dos embargos de retenção após a sentença, pois esses embargos são cabíveis apenas na execução para a entrega da coisa fundada em título extra-judicial como reza o artigo 744 do Código de Processo Civil.
Procedimento das Ações de Manutenção e Reintegração na Posse
O procedimento é idêntico nas duas ações, embora os seus objetivos sejam diferentes.
De acordo com o artigo 927 do Código de Processo Civil, o autor deve:
1º) demonstrar a posse anterior sobre a coisa;
2º) a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
3º) a data em que a posse foi violada;
4º) a preservação da posse, embora turbada em se tratando de ação de manutenção e a perda da posse em se tratando de ação de reintegração.
Se houver prova pré-constituída da presença dos requisitos legais (prova literal) cabe deferimento da medida liminarmente “inaudita altera pars” em se tratando de ação de força nova. O réu pode manifestar agravo de instrumento contra essa decisão liminar.
Se não houver prova pré-constituída, os fatos mencionados no artigo 927, faculta-se ao autor, a justificação prévia devendo o réu ser citado para comparecer a audiência de justificação.
Nessa hipótese, o juiz não defere de plano o mandado liminar.
Na audiência o autor produzirá prova testemunhal podendo o réu, por meio de advogado contraditar as testemunhas e formular perguntas.
Entende-se que o réu não pode produzir prova oral nesta audiência. Não estamos diante de audiência de instrução e julgamento colhendo-se a prova apenas para fornecer ao juiz elementos para a apreciação do pedido de liminar.
Se for acolhida da justificação, o juiz determinará a imediata expedição do mandado de reintegração ou de manutenção. Rejeitada a justificação, a medida liminar será negada prosseguindo-se com a instauração de contraditório.
Cabe agravo de instrumento contra a decisão de juiz.
Se a ré é pessoa jurídica de direito público não cabe indeferimento de liminar sem prévia audiência de seu representante judicial como dispõe o artigo 928, § único do Código de Processo Civil.
Não sendo designada audiência de justificação, concedida ou não a liminar de plano, o réu será citado para apresentar resposta em 15 dias.
Se for realizada a audiência de justificação o réu já terá sido citado passando a fluir o prazo de 15 dias para resposta da data que foi intimado da decisão que deferir ou não a medida liminar.
Entende-se que se o réu não comparecer a audiência de justificação e nem se fez representar por advogado apesar de validamente citado considera-se intimado da decisão a ser proferida iniciando-se desde logo o prazo para resposta. A questão é controvertida.
Se o réu foi citado pessoalmente e pautou-se pela revelia aplica-se o artigo 330, II do Código de Processo Civil.
Se o réu foi citado por edital ou hora-certa, o juiz deve nomear curador especial para apresentar contestação.
Contestado ou não o pedido, o juiz deverá verificar se é caso ou não de extinção do processo ou julgamento antecipado de acordo com os artigos 329 e 330 do Código de Processo Civil. Caso contrário deverá observar o artigo 331 do Código de Processo Civil.
Na contestação, o réu pode postular a proteção possessória em seu favor, além da composição de perdas e danos, assim em princípio não cabe reconvenção.
Podem ser apresentadas, no entanto, as exceções instrumentais como prevê o artigo 304 do Código de Processo Civil.