Na aula de hoje foi tratado a questão dos crimes qualificados pelo resultado, especificamente tratado dos crimes preterdolosos. Também foi discorrido os artigos 19 e 20, que possuem ligação direta com este tipo de crime.
Crimes Preterdolosos
Crimes qualificados pelo resultado são condutas cometidas pelo agente caracterizadas como crime, mas que possuem um resultado acrescentado, gerando um agravamento da sanção penal. Para tanto, existem dois momentos deste tipo de crime. O primeiro realiza-se com o crime culposo ou doloso propriamente dito, denominado fato antecedente. O segundo, que é o resultado agravador da sanção penal, que também pode ser produzido culposa ou dolosamente, é o fato consequente.
Existem quatro tipos de crime qualificados pelo resultado: a) aqueles em que os fatos antecedente e consequente são dolosos, caso de lesão corporal com natureza grave ou gravíssima; b) aqueles em que o fato antecedente e consequente são culposos, caso de incêndio culposo que resulta em homicídio culposo das pessoas que estavam no local; c) aqueles em que o fato antecedente é culposo e o consequente é doloso, caso de lesão corporal culposa de trânsito onde há omissão de socorro; d) e por último, conhecido como crime preterdoloso (além do dolo), a conduta antecedente dolosa e a consequente culposa, caso do roubo em que ocorre a morte da vítima.
Logo, crime qualificado pelo resultado é o gênero da espécie aqui estudada, o Crime Preterdoloso.
Crime Preterdoloso, ou crime preterintencional, é a conduta inicial dolosa do agente com resultado diverso do almejado e mais grave.
Segundo Damásio E. de Jesus, em sua obra Direito Penal, Parte Geral, 20 Ed., são preterintencionais aqueles crimes em que a ação causa um resultado mais grave que o pretendido pelo agente.
Júlio Fabbrini Mirabete em seu Manual de Direito Penal, Parte Geral arts.: 1º a 120 do Código Penal, 16 Ed., considera os crimes preterdolosos um tipo de crime misto, pois há uma conduta dolosa que se dirige a um fim típico, que é culposa porque causa um outro resultado que não era objeto do crime fundamental, por inobservância do cuidado objetivo.
Exemplo clássico de preterdolosos é a lesão corporal seguida de morte, em que há a conduta antecedente dolosa – lesionar a vítima – e a consequente mais grave, culposa – a morte da mesma.
Para tal conexão entre as condutas dolosa e culposa, respectivamente, será necessária a imputatio juris, o nexo normativo, para que o agente responda pelo excesso em sua conduta. É preciso que haja um liame normativo entre o sujeito que pratica o primum delictum e o resultado qualificador, caso contrário, seguindo o que traz a norma penal em seu artigo 19, nada lhe poderá ser imputado, afinal, pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o tenha causado ao menos culposamente. Nos casos de caso fortuito ou força maior o mesmo acontece.
Outro importante detalhe nos Crimes Preterdolosos é que a tentativa não é punível, já que esta é impossível. Isso acontece porque se o resultado agravador não era o pretendido pelo agente, não será possível tentar produzi-lo. São, portanto, afastadas todas e quaisquer possibilidades da ocorrência de tipicidade.
Entretanto, Fernando Capez traz um exemplo em sua obra Curso de Direito Penal, Parte Geral, Vol. 1, em que, em tese, seria possível visualizar a tentativa em Crimes Preterdolosos. É o caso do aborto qualificado pela morte ou lesão grave da gestante em que o feto sobrevive, mas a mãe morre ou sofre lesão corporal de natureza grave ou gravíssima (Código Penal, art. 127). O aborto seria em tese, tentado, e o resultado agravador culposo. Mas, mesmo dando como possível caso de tentativa de crime preterdoloso este caso, Capez entende “que o aborto foi consumado, ainda que não tenha havido supressão da vida intra-uterina, nos mesmos moldes que ocorre latrocínio, quando o roubo é tentado, mas a morte consumada”.
Preterdolosos são, portanto, crimes dolosos com resultados culposos não previstos pelo agente, caso este que não cabe tentativa, porque esta é impossível. Para tanto, é necessário o nexo normativo entre a conduta dolosa do agente e o resultado culposo que agrava o pretendido, caso contrário o agente não poderá lhe ter o fato imputado.
Fonte: www.jurisway.org.br (Rafaella Andrade Villela de Oliveira)
Art. 19 – Agravação pelo resultado
Art. 19 – Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente.
a) Dolo no antecedente e dolo no consequente; (ex. latrocínio)
b) Dolo no antecedente e culpa no consequente (preterdolo). (ex. crime autônomo – homicídio, aborto…)
‘Alguns crimes admitem as duas possibilidades (‘a’ e ‘b’) desde que para o resultado consequente não exista crime autônomo. Ex.: homicídio, aborto…’
‘Caso exista crime autônomo para o resultado, a figura do resultado qualificador só é possível na possibilidade preterdolosa (dolo no antecedente e culpa no consequente).’
Atos cujo resultado extrapola a vontade do agente só o responsabilizam penalmente quando forem praticados ao menos culposamente, ao menos quando ele agiu sem observar um dever de cuidado, atuando com imprudência, negligência ou imperícia.
Uma responsabilização que extrapola a órbita do dolo e da culpa, por sua vez, torna-se objetiva. A responsabilidade objetiva, contudo, é rejeitada pela norma penal, que aceita apenas o dolo ou a culpa. O dispositivo penal em análise contempla tal entendimento.
Sobre os crimes preterdolosos, encontrados de forma esparsa no Código Penal, caracterizam-se eles por preverem uma conduta inicial dolosa e um resultado adicional culposo, que justifica o agravamento da sanção.
Um exemplo clássico é a lesão corporal seguida de morte (art. 129, §3º, do Código Penal), na qual se pode falar em dolo na lesão corporal e culpa no evento morte. Ainda que este último não tenha sido o objetivo pretendido pelo autor, está previsto como resultado culposo, razão pela qual incide responsabilidade penal sobre ele.
À luz do art. 19 do Código Penal, a responsabilidade do autor não poderia ir além da culpa, justamente porque se tornaria objetiva. Pode se dizer, então, que a lesão corporal seguida de morte, assim como outros delitos preterdolosos, versa sobre hipótese na qual o dolo e a culpa estão previstos no tipo penal, sendo o resultado plenamente oponível ao autor, porque previsto também a título de culpa.
Art. 20 – Erro sobre elementos do tipo
Art. 20 – O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.
Descriminantes putativas
§ 1º – É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.
Erro determinado por terceiro
§ 2º – Responde pelo crime o terceiro que determina o erro.
Erro sobre a pessoa
§ 3º – O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.
1) Erro de tipo (excludente de dolo)
a) Evitável (vencível ou inescusável): Exclui, mas responde por culpa.
b) Inevitável (invencível ou escusável): Exclui dolo e culpa.
2) Erro de tipo acidental
a) ‘error in objecto’ – erro sobre o objeto
b) error in persona – art. 20, §3º
c) erro de execução (aberratio ictos)
d) aberratio delictus – erro de delito (art. 74) (resultado diverso do pretendido)
e) aberratio causae – erro na consumação do crime
O erro sobre algum dos elementos do tipo penal constitui o que a doutrina denomina erro de tipo. Ele ocorre quando o autor do fato se engana, na situação concreta, sobre a ausência de algum elemento do tipo que, na verdade, está presente. Caso reste verificado o efetivo engano, advindo de imprudência, negligência ou imperícia, afasta-se o dolo de sua conduta, remanescendo, contudo, a culpa.
Neste caso, ele será punido como incurso na prática de crime culposo, caso haja previsão legal nesse sentido.
De outro lado, ainda que não haja expressa menção no caput do artigo 20 do Código Penal, tem-se que a absoluta imprevisibilidade do erro é apta para excluir tanto o dolo como a culpa. Nesta hipótese, contudo, o erro deve ser reconhecido como inevitável.
Ex: TJRGS – VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS. PROVA. RECONHECIMENTO DE ERRO DE TIPO. INVIABILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO. LEI DE SOFTWARES. ILEGITIMIDADE ATIVA. INOCORRÊNCIA. Réu que expôs à venda DVDs de jogos de videogames falsificados, mídias que são abrangidas pela proteção da propriedade intelectual de programa de computador, prevista em Lei Especial, assim atraindo infração penal própria, que não aquela preconizada no artigo 184, 2º, do Código Penal. Hipótese, outrossim, de ação penal pública, tendo em vista a perda de arrecadação tributária representada pela conduta, segundo exceção constante do § 3º do artigo 12 da Lei 9.608, no qual previsto o crime. A existência de outras pessoas perpetrando a mesma espécie de infração não traz consigo a descriminalização da conduta prevista em figura legal típica. Inviável o reconhecimento do erro de tipo na medida que a falsidade é visível a olho nu e que transparece até dos preços por que vendidos. Apelo parcialmente provido para desclassificar o delito. (TJRGS – Apelação Crime n.º 70037821550, 4.ª Câmara Criminal, rel. Des. Marcelo Bandeira Pereira, j. em 09/09/2010).
As descriminantes putativas, por sua vez, nascem igualmente de um erro do autor. Em face destas, contudo, ele acredita estar diante de uma verdadeira legítima defesa, um estado de necessidade, etc., enfim, de uma autêntica descriminante. Mas, na verdade, sua percepção dos fatos é equivocada e a descriminante foi apenas imaginada por ele, pois, de fato, ela não existe.
Nestas hipóteses, se as circunstâncias justificavam de modo absoluto o engano do autor, estará ele isento de pena. No entanto, tratando-se de erro inescusável, ele responderá por crime culposo, se houver previsão de alguma modalidade culposa do delito.
Na hipótese do §2.º do artigo 20 do Código Penal transfere-se a responsabilidade do fato ao terceiro que provocou o erro. No entanto, ele só responderá pelo erro se teve condições de determiná-lo como tal, de forma dolosa ou culposa.
A disciplina do §3.º do artigo 20 do Código Penal, por sua vez, estabelece que, na hipótese de erro sobre a pessoa ofendida, prevalece, para efeitos penais, as condições ou qualidades daquela que o autor pretendia lesar.
Frases proferidas: ‘obrigado pela sua participação’, ‘Dr. eu matei! – Calma, você não matou ninguém, estão dizendo que você matou!’.
“… O artigo 19 extirpa do ordenamento juridico a chamada responsabilidade penal objetiva. Não há pena sem culpabilidade…” Greco
erro: falsa representação da realidade ou falso ou equivocado conhecimento de um objeto(é um estado positivo). Conceitualmente , o erro difere da ignorancia: esta é a falta de representação da realidade ou o desconhecimento total do objeto(é um estado negativo).
Prezada Dra. Ana,
Pelo visto, mais um ‘SS’ se avizinha! Assídua frequentadora do olibat.com.br.
Fico feliz em ver um dos meus artigos aqui.
Que ele ajude outros colegas, e futuros colegas também.