Palestra 10.04.12
Esta foi, sem dúvidas, a melhor dentre todas as palestras que tive a oportunidade de participar. O professor Barroso, além de ser uma referência na área jurídica (notadamente em direito constitucional), possui um dom excepcional da oratória, fazendo com que um tema complexo e divergente como dignidade da pessoa humana, pareça ser trivial.
Nesta palestra cujo tema foi “A dignidade humana no direito constitucional contemporâneo: natureza jurídica, conteúdos mínimos e critérios de aplicação” o professor Barroso fez, inicialmente, uma explanação histórica e conceitual do que seria a dignidade humana, no escopo da constituição federal, afirmando estar (a dignidade da pessoa humana) na origem de todos os direitos fundamentais e ao mesmo tempo não se tratar de um direito fundamental, mas sim de um princípio jurídico, do centro axiológico da justiça, ou seja, algo maior.
Posteriormente citou vários exemplos concretos da banalização (dado que a vida ficou mais complexa) do uso deste princípio, sendo invariavelmente encarado, de forma errada, como uma ’panacéia jurídica’ para a resolução de diversas lides, alguns casos inclusive, onde os dois lados invocaram este mesmo princípio para defender as suas teses (“quando um conceito pode ser invocado por ambos os lados, este não serve para nada”), de modo que, se faz necessário sistematizar e estruturar um conceito operacional visando, objetivamente, conceituar o que seria a dignidade humana, reduzindo assim o uso indiscriminado de um princípio tão caro, senão o mais importante, do ordenamento jurídico. Ingo Sarlet em seu livro Eficácia dos direitos fundamentais, também cita a chamada ‘banalização’ do uso do princípio da dignidade da pessoa humana para a resolução de questões das quais não caberia invocar este princípio.
Posto isso o professor Barroso passou a explanar a sua tese, o seu conceito operacional, os seus critérios de aplicação, ou ainda o conteúdo mínimo para que um determinado assunto se enquadre necessariamente em violação do princípio da dignidade da pessoa humana. Defendeu que existem três conteúdos atribuídos à dignidade da pessoa, sendo estes: o valor intrínseco, a autonomia e o valor comunitário.
O valor intrínseco diz respeito a posição especial da pessoa no universo, são os atributos que singularizam o homem e a mulher no universo da criação. Recorreu a Kant afirmando que as coisas tem preço, mas as pessoas possuem dignidade, e esta última não tem valoração. Utilizou dois postulados para explicar este conteúdo (de valor intrínseco), sendo estes o postulado do anti-utilitarismo e o do anti-totalitarismo, o primeiro relacionado a questão de que toda pessoa é um fim em si mesma e não um meio para que outros realizem os seus propósitos; e o segundo alegando que nenhuma pessoa pode ser tratada como um súdito do Estado. Juridicamente o valor intrínseco está ligado ao conjunto de direitos fundamentais como a vida, a integridade física, a igualdade e a integridade moral.
A autonomia está relacionada com a razão e a capacidade que uma pessoa tem de ter vontade, valorações morais e escolhas. Dar a si próprio as normas que regem a sua conduta. Juridicamente esta autonomia pode ser vista em dois aspectos, sendo o privado e o público. A autonomia privada correspondendo ao conjunto de liberdades individuais inerentes de cada um; já a autonomia pública diz respeito aos direitos particulares de que cada um tem de participar da vida pública, da ordem jurídica, da sociedade que está inserida. Mas para que esta autonomia ocorra é suficiente e necessário que a pessoa tenha o mínimo existencial atendido em sua plenitude, ou seja, tenha condições básicas de saúde, moradia, educação, subsistência…
O último conteúdo trata-se do chamado valor comunitário, onde algumas situações de autonomia podem ser legitimamente limitadas em nome de determinados valores compartilhados pela sociedade. Citou o exemplo de que seria inaceitável alguém alegar, sob o prisma da dignidade da pessoa humana, que tem direito a praticar atos de pedofilia. Advogou três motivações para a aplicação do chamado valor comunitário, sendo a de assegurar o direito de outrem; de proteger a pessoa de si própria; e a de impor determinados valores sociais (este último arriscado, pois um Estado paternalista poderá limitar as escolhas impondo o seu ideário moral).
De forma primorosa o professor concluiu a sua palestra apresentando os três conteúdos mínimos e os critérios de aplicação quando se trata da utilização do princípio da dignidade da pessoa humana.
Abaixo constam algumas frases proferidas pelo Professor Barroso, que reforçam a sua nova visão sobre a aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana:
“A dignidade da pessoa humana é um dos grandes conceitos abordados pós II Guerra Mundial.”
“As coisas tem preço, as pessoas tem dignidade, e esta última não possui valoração.”
“Não é incomum que os dois lados de uma lide invoquem a dignidade da pessoa humana.”
“Dizer que uma pessoa tem direito a dignidade da pessoa é quase que dizer que tem direito à vida (excetuando os casos de aborto, pena de morte e eutanásia…).”
“Toda pessoa é um fim em si mesma e não um meio para que outros realizem os seus propósitos.”
“Nenhuma pessoa pode ser tratada como um súdito do Estado.”
“Quando um conceito pode ser invocado por ambos os lados, este não serve para nada.”
“A vida ficou muito mais complexa… a exemplo do casamento, que atualmente pode ser realizado de 4 formas diferentes.”
“Questões da dignidade da pessoa humana se multiplicam em casos concretos a cada dia.”
“A vida ficou muito mais interessante, mas também mais complicada.”
“Defendo a criação de um conteúdo mínimo para a dignidade da pessoa humana.”
“O positivismo jurídico reduziu tudo a norma, descartando as questões filosóficas, dos valores, da moral…”
“O facismo e o nazismo, por exemplo, alegaram que suas ações (e atrocidades) foram realizadas com base nas leis positivadas vigentes.”
“Toda sociedade possui um conjunto mínimo de valores que impõe ao restante.”
O relatório de atividades de extensão complementares correspondente a esta palestra foi devidamente entregue ao NEAC:
Abaixo consta um vídeo, pescado na net, onde o professor Luis Roberto Barroso, profere uma aula magna.