Esta é, sem dúvidas, uma das melhores tragédias já escritas pelo homem. O grego Sófocles (495-406 a.C.) sabia como se expressar e provocar sentimentos no leitor levando-o a refletir sobre questões universais. Ele escreveu 123 obras, mas somente 8 chegaram aos nossos dias: Os Sabujos, Ajax, Antígona, As Traquínias, Édipo Rei, Electra, Filoctetes e Édipo em Colono. Sófocles é considerado o sucessor de Ésquilo e o último dramaturgo do período áureo de Atenas. As suas obras foram escritas em forma de peças teatrais. As sequências de Édipo Rei são Antígona e Édipo em Colono.
O mito do filho amaldiçoado pelo destino a matar o pai e a se casar com a mãe foi citado desde Aristóteles, Foucault (em A verdade e as formas jurídicas, por exemplo) até os mais diversos pensadores, clássicos ou contemporâneos. É uma das histórias mais conhecidas graças ao seu uso pela psicanálise de Freud como fundamento da psiquê humana. Mas a história vai além de Freud, pois mexe em algo nas profundezas de nosso ser. Provoca sentimentos e tabus, compaixão e revolta, e faz repensar a obstinação e o orgulho. Sófocles provoca as bases de duas crenças defendidas hoje em dia como axiomas.
Primeiro, enquanto a maioria crer poder decidir o seu próprio futuro, para Édipo é impossível fugir do que foi traçado pelos deuses e pelo destino. Somos levados a nos perguntar: Se tudo em nossa vida já esta pré-determinado, para que serve o livre-arbítrio? Independente de nossas escolhas, sempre iríamos acabar no ponto exato destinado a nós. Livre-arbítrio e destino são idéias incompatíveis? A ideologia dos humanos serem marionetes do destino foi usada, e muito, para justificar o domínio de uns sobre outros. Se você nasceu pobre, feio, doente ou infeliz é porque os deuses e o destino assim o quiseram e nada que você faça mudará a situação. Mas há aqueles que não são Édipos, e acreditam que fazem os seus destinos. Chova ou faça sol, são obstinados em atingir os seus alvos.
Em segundo lugar, enquanto se ensina que a busca pela verdade e conhecimento é o caminho correto para a felicidade, em Édipo Rei eles levam à desgraça. Édipo e Jocasta viviam felizes na ignorância. Eram amaldiçoados mas não sabiam disso. É o que hoje se discute muito, se o conhecimento torna o homem mais feliz ou não. Os que acreditam que sim defendem que só precisamos ser seletivos quanto ao tipo de conhecimento escolhido, visto que muita coisa é apenas informação inútil ou prejudicial. Lixo.
O desfecho da tragédia leva à uma moral atemporal: “Guardemo-nos de chamar um homem feliz, antes que ele tenha transposto o termo de sua vida sem ter conhecido a tristeza“.
Resenha elaborada por JLM, em abril de 2007.
RESUMO I
“Édipo Rei” passa-se em Tebas, cidade grega fundada por Cadmo, em frente e dentro do palácio do Rei Édipo. A ação começa com o povo tebano em frente aos altares do palácio do rei, suplicando por ajuda, pois sua cidade perece. O rei Édipo acalma o povo, dizendo que vai fazer de tudo para salvar a cidade novamente.
Para o povo tebano, o Rei Édipo está logo abaixo dos deuses, pois ele conquistou o reinado em Tebas após livrá-la das desgraças que a Esfinge trazia para a cidade.
Para saber o que é necessário fazer para ajudar a cidade, Édipo envia Creonte, seu cunhado, para consultar o Oráculo no templo de Apolo, onde fica sabendo que deveriam expulsar ou matar aquele que matou o Rei Laio e que o assassino estava na cidade.
Creonte explica a Édipo como havia sido a morte do antigo rei, ou seja, a versão que contavam como se fosse certa, que o comboio do rei foi morto por salteadores. Ao saber o que precisava para começar a investigação em busca do assassino, Édipo anuncia que fará de tudo para capturar o assassino.
Para ajudar na investigação chamam Tirésias, um velho cego e que de tudo sabe através do canto e do vôo dos pássaros. Este, porém, não quer falar sobre o acontecido, já que tal revelação poderia trazer mais infelicidade, principalmente para o rei. Após muitas ameaças do rei, Tirésias diz que o assassino é o próprio rei.
O rei então acusa Creonte e Tirésias de tramarem para tomar seu lugar no trono. Neste momento, o rei perde seu senso de justiça e começa a julgar o que não sabe.
Antes de se retirar, Tirésias diz as palavras que são a essência desta tragédia grega: “o homem que procuras há tanto tempo, por meio de ameaçadoras proclamações, sobre a morte de Laio, ESTÁ AQUI! Passa por estrangeiro domiciliado, mas logo se verá que é tebano de nascimento, e ele não se alegrará com essa descoberta. Ele vê, mas tornar-se-á cego, é rico, e acabará mendigando; seus passos o levarão à terra do exílio, onde tateará o solo com seu bordão. Ver-se-á, também, que ele é ao mesmo tempo, irmão e pai de seus filhos, e filho e esposo da mulher que lhe deu a vida; e que profanou o leito de seu pai, a quem matara”.
Jocasta, esposa de Édipo e irmã de Creonte interfere e este parte em exílio. Édipo conta para ela o que o velho adivinho lhes disse. Ela, porém, diz para Édipo não se preocupar com adivinhações, pois o mesmo fizeram com ela e Laio quando um oráculo os avisou que Laio seria morto pelo filho e que esse filho se casaria com ela. No entanto, Laio foi assassinado por salteadores e o filho que eles tiveram morreu muitos anos antes, quando Laio amarrou-lhe os pés e ordenou que um servo o deixasse em uma montanha inacessível, ou seja, a profecia não se cumprira.
Édipo então começa a questioná-la sobre exatamente onde, quando e como Laio morreu, que idade tinha e como ele era. Ao ouvir as respostas da rainha, Édipo vai concluindo que ele pode ser realmente o assassino do rei, já que alguns anos antes, ele matou alguns homens exatamente como a rainha estava descrevendo. Édipo revela à Jocasta que a mesma profecia foi dita a ele através de um oráculo, que ele mataria seu próprio pai e se casaria com sua mãe. Disse ainda que ao saber disso fugiu de sua cidade em direção a Tebas, porém no caminho encontrou um comboio com o qual se desentendeu e matou a todos.
Ao saber que um servo que estava no comboio conseguiu salvar-se, Édipo ordena que lhe chamem imediatamente. Então, a única esperança de Édipo é que o sobrevivente diga que realmente foram atacados por salteadores.
Enquanto esperam que o antigo servo chegue, chega um mensageiro vindo de Corinto (onde Édipo cresceu pensando ser filho do rei Políbio) e anuncia que os cidadãos de sua cidade aclamam Édipo novo rei, já que o rei Polibio (pai adotivo de Édipo) morreu. Ao ouvir estas palavras Édipo se sente aliviado em saber que não foi o culpado da morte do pai, mas ainda receia que possa fazer algo a sua mãe. Ao perceber que o mensageiro acreditava que ele retornaria à sua cidade, ele logo explica para o mensageiro sobre a profecia e diz que não retornará. O mensageiro então explica que ele não é filho de Políbio e Mérope e diz que ele mesmo o recebeu das mãos de um pastor que era servo do rei Laio. Chega então este servo, que o mensageiro logo reconheceu e o questionou sobre a criança que ele lhe entregara muitos anos antes, este, porém, só confessou após múltiplas ameaças de Édipo. Disse ainda que diziam que o menino era filho do próprio rei Laio e que tinham o entregue para que o deixasse morrer, para que não se cumprisse a profecia.
Tudo estava se esclarecendo, Édipo era filho e homicida de seu pai, filho e marido de sua mãe, a profecia se cumprira e agora ele era o mais infeliz dos homens.
Ao saber de tudo, Jocasta se suicida e Édipo, ao vê-la, fura os próprios olhos, já não queria mais ver um mundo que não era agradável a ele.
Creonte, agora o novo rei, retorna e Édipo pede que ele o mande para longe onde possa estar sozinho. Esta obra-prima de Sófocles termina com Creonte dizendo que vai consultar o oráculo para saber o que realmente deve ser feito.
RESUMO II
Édipo, cujo nome significa “o de pés inchados”, era filho dos reis de Tebas, Laio e Jocasta (a quem Homero chamou Epicasta).
O oráculo do deus Apolo em Delfos profetizou que, quando chegasse à idade adulta, ele mataria o pai e se casaria com a mãe.
Laio, horrorizado, ordenou que o filho fosse abandonado no bosque, com os tornozelos amarrados por uma corda.
Um pastor encontrou a criança ainda com vida e levou-a a Corinto, onde foi adotada pelo rei Políbio.
Já adolescente, Édipo ouviu também a profecia do oráculo e, acreditando-se filho de Políbio, fugiu de Corinto para escapar ao destino.
No caminho, encontrou um ancião acompanhado de vários servos.
Desentendeu-se com o viajante e matou-o, sem saber que era seu verdadeiro pai, Laio.
Ao chegar a Tebas, Édipo encontrou a cidade desolada.
Uma esfinge às portas da cidade propunha aos homens um enigma e devorava os que não conseguiam decifrá-lo.
A rainha viúva, Jocasta, prometera casar-se com quem libertasse a cidade desse monstro.
Édipo decifrou o enigma e casou-se com sua mãe, consumando a profecia.
Desse matrimônio nasceram quatro filhos: Etéocles, Polinice, Antígona e Ismene.
Passado o tempo, uma peste assolou Tebas e o oráculo afirmou que só vingando-se a morte de Laio a peste cessaria.
As investigações que se seguiram e as revelações do adivinho Tirésias demonstraram a Édipo e Jocasta a tragédia de que eram protagonistas.
A rainha matou-se e Édipo vazou os próprios olhos e abandonou Tebas, deixando seu cunhado Creonte como regente.
Acolhido em Colona, perto de Atenas, graças à hospitalidade do rei Teseu, Édipo morreu misteriosamente num bosque sagrado e converteu-se em herói protetor da Ática.
A maldição de Édipo transmitiu-se a seus filhos, que tiveram igualmente destino trágico.
A tragédia de Édipo ilustra a impossibilidade do homem lutar contra o destino, valor situado na base da mentalidade grega, formada sob a égide da mitologia até o advento da filosofia.
Freud, criador da psicanálise, renovou o interesse pelo tema ao designar como “complexo de Édipo” uma fase crucial do processo de desenvolvimento normal da criança: o desejo de envolver-se sexualmente com o genitor do sexo oposto, aliado a um sentimento de rivalidade em relação ao genitor do mesmo sexo.
Pingback: A verdade e as formas jurídicas – Michel Foucault | Projeto Pasárgada